quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Melhor que Kyoto



Cento e oitenta contra um: os acordos de Kyoto foram aprovados por unanimidade menos um. O professor Ronald Reagan estudou Ciência Políticas nos filmes de Far West. Agora seu aluno, como nos filmes, enfrenta sozinho todos os demais.
Bem sabe o justiceiro que toda essa história de Kyoto não passa de uma conspiração. Está em jogo o direito dos Estados Unidos de seguir desenvolvendo seu modo de vida, que se fundamenta no amor aos membros mais queridos da família: os que dormem na garagem. E eles não tem outro remédio senão suportar em silêncio as calúnias. Os ecoterroristas, agitadores a soldo do transporte público, andam propalando que os automóveis lançam veneno no ar e arruínam a atmosfera. E assim se abusa impunemente da paciência dos cidadãos de quatro rodas, que não podem nem piar. É um escândalo, mas é assim: os carros ainda não tem o direito do voto embora sejam mais numerosos do que toda a população adulta norte-americana.
Os inimigos do progresso vêem a realidade com óculos escuros e anunciam catástrofes: céu intoxicado, clima enlouquecido, planeta requentado... Neste passo, dizem, ninguém se salvara. Nem nós, os uruguaios: se continuarem a se derreter os gelos do pólo, ficaremos sem agua potável e sem praias. Mas o nosso é um país livre. Se ficarmos sem água para beber, teremos a liberdade de escolher entre a Coca-Cola, a Pepsi e outros refrescos. E se ficarmos sem praias, que são as culpadas da ociosidade nacional, nossa maltratada economia poderá elevar espetacularmente seus índices de produtividade. Ora, não é assim que vão nos assustar.
Até quando o mundo continuará aturando essas apocalípticas profecias? Não terá chegado a hora de proibir de uma vez por todas, em todos os idiomas e em todos os países, a circulação de informes científicos que andam alarmando a opinião publica?



2001

Eduardo Galeano

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